sábado, 10 de março de 2012

Referendo e Plebiscito : as armas dos cidadãos

Bruno Konder Comparato
Publicado no Jornal Jovem edição n°2 Março/ 2006
www.jornaljovem.com.br

Referendo e Plebiscito: as armas dos cidadãos

Numa eleição normal votamos em um candidato, em um plebiscito ou referendo, respondemos a uma pergunta proposta pelo governo.Embora os termos plebiscito e referendo sejam freqüentemente empregados como se fossem sinônimos, trata-se de duas realidades diferentes.

O termo plebiscito teve origem no direito romano, no qual era empregado para designar uma lei adotada pelo voto dos plebeus, ou seja, dos homens do povo, obedecendo a uma solicitação dos magistrados da Roma antiga.

O termo referendo, por sua vez, surgiu nas antigas Confederações Germânicas e Helvéticas, no século XIX, nas quais todas as leis eram aprovadas ad referendum do povo, ou seja, desde que obtivessem como resposta o consentimento da população. Portanto estes termos trazem desde a sua origem, a idéia de consulta à opinião pública. Por esta razão é que atualmente se diz que eles fazem parte dos mecanismos de democracia direta. Com efeito, por meio deles o povo pode participar, por via consultiva ou deliberativa, no processo decisório.

A Suíça é a pátria dos referendos. Desde 1848, ano em que formaram uma federação, os cidadãos suíços já se manifestaram em 521 consultas populares, a respeito da ratificação de tratados internacionais, revisões constitucionais ou aprovação de leis sobre os mais variados assuntos, como a energia nuclear, o divórcio, a naturalização de estrangeiros, a entrada do país na ONU. Trata-se, contudo, de um caso particular. De uma maneira geral, os referendos são raros na maioria dos países.

A decisão da Noruega de se separar da Suécia em 1905, por exemplo, foi aprovada num referendo em que 99,9% dos noruegueses votaram a favor da independência, numa expressão forte de orgulho nacional. A Islândia também se separou da Dinamarca em seguida a um referendo.

O processo de unificação da Itália incluiu uma série de plebiscitos e a República Italiana foi instituída por referendo em 1946. Pelo mesmo mecanismo, os espanhóis aprovaram reformas democráticas ao final dos anos setenta, após a morte do general Franco.

No Brasil o regime de governo já foi objeto de dois referendos: em 1963, quando o parlamentarismo adotado com a renúncia de Jânio Quadros à presidência da república foi revogado, e em 1993, quando o regime presidencialista foi confirmado pela população.

Os EUA podem se orgulhar de terem patrocinado um grande número de consultas populares locais.

A história mostra, também, que plebiscitos ou referendos são utilizados, às vezes, para testar o apoio dos eleitores ao governante no poder. É o caso do plebiscito para manter Luis Napoleão na chefia do estado francês, em 1851. O anschluss, a anexação da Áustria pela Alemanha nazista, em 1938, seguiu-se ao anúncio desastrado de um plebiscito sobre a independência da Áustria. O estadista francês de Gaulle fez amplo uso das consultas populares para reafirmar o seu poder.

Um episódio recente ilustra bem como estes mecanismos podem ser deturpados quando são utilizados para legitimar governantes no poder: em 2002, cidadãos iraquianos assinalaram com sangue o seu desejo de que Saddam Hussein permanecesse mais sete anos no poder.

Referendo e Plebiscito - Como funciona em outros países?

Austrália - As reformas constitucionais devem ser aprovadas por referendo.

Áustria - Toda reforma constitucional importante deve ser aprovada por referendo se um terço dos membros do Conselho Nacional ou do Conselho Federal (a câmara alta que representa as províncias) assim o desejarem.

Dinamarca - As reformas constitucionais devem ser aprovadas pela maioria simples dos votos em um referendo, com participação de pelo menos 40% do eleitorado.

França - As reformas constitucionais precisam ser confirmadas seja por uma maioria de três quintos das duas câmaras reunidas, seja por referendo.

Irlanda - Um projeto de lei para reformar a constituição é necessário somente se ele for exigido por um quinto dos representantes de uma das duas câmaras, por 500 mil eleitores ou por cinco conselhos regionais, num prazo de três meses após a publicação da reforma.

Espanha - Uma reforma constitucional pode ser submetida a referendo para ser ratificada, se um décimo dos integrantes de uma das duas câmaras o solicitar num prazo de 15 dias após a adoção da reforma.

Suíça - Todas as reformas constitucionais precisam ser confirmadas pela maioria dos cidadãos. Além disso, todo projeto de lei proposto por 50 mil cidadãos torna-se objeto de um referendo (a menos que o Parlamento adote o projeto e os autores do referendo retirem a sua iniciativa). As reformas constitucionais devem ser aprovadas pela maioria dos eleitores e pela maioria dos cantões.

O problema da expansão do sufrágio e da universalização do voto foi resolvido no século vinte. Agora, cresce cada vez mais o número de pessoas que acredita que não basta escolher periodicamente os nossos representantes e governantes para que um governo democrático seja garantido. Deveríamos, neste sentido, multiplicar as oportunidades de manifestação da vontade popular. De acordo com a feliz expressão do pensador italiano Norberto Bobbio, o problema hoje em dia não é mais quando se vota, mas quanto se vota.

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